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quarta-feira, 19 de julho de 2017

Já aprendeste com os teus erros?



Uma das coisas que me tem incomodado bastante nos últimos tempos é perceber como é que podemos aprender com os erros. Sim, não sou daquelas que digo que nunca erro, que não faço asneiras, que numa ou noutra ocasião não possa ter deitado tudo a perder.

O que me incomoda é como é que se errámos, com outros ou connosco próprios, esse ou esses erros não são suficientes para aprendermos com eles, para não os voltarmos a cometer.

Tantas vezes que nos sai um “nunca mais” – faço isso, caio nessa, me engano, me enganam, magoo alguém ou a mim própria. Então porque é que volta a acontecer?

Uma das coisas que tenho percebido é que somos péssimos a julgar o futuro, a imaginar-nos no futuro, a pensar como temos de proceder no futuro. Será um problema do nosso cérebro? Pronto, e assim parece que estamos já a arranjar um culpado em vez de assumirmos apenas que somos nós que somos assim.

Mas porque é que cometemos os mesmos erros ou outros muito semelhantes vezes e vezes sem fim?

É fácil, num dia muito feliz, de celebração, ou num dia muito ruim, é fácil dizer e acreditar que as coisas vão ser diferentes. Mas depois não são. Sabemos cá dentro o que tem de mudar, mas não avançamos da ideia para a acção. E provavelmente nem essa verdadeira mudança cognitiva é feita. Mas porque é que os nossos cérebros permanecem exactamente na mesma? Tantas vezes a tomar a pior das decisões, a virar-se contra nós?

Porque é que resistimos à mudança, mesmo quando precisamos dessa mudança, quando sabemos que ela nos vai salvar, quando sabemos que não temos tantas oportunidades assim para fazer da nossa vida uma vida nova, diferente?

Será que a resposta é que, quando uma coisa boa acontece….ou uma má, olhamos para o futuro a querermos acreditar que vamos fazer diferente, mas esquecemo-nos de olhar com olhos de ver para o passado, para percebermos mesmo o que é que fizemos de errado?



Isto leva-me a outra questão. Será que não aprendemos com os nossos erros porque achamos que um erro define tudo o que somos e que nem vale a pena tentar ser diferente? No fundo, queremos mudar, mas queremos continuar na mesma, porque mudar implica dor, sofrimento e ao mesmo tempo uma dose muito grande de sensibilidade e auto-estima para nos perdoarmos. Para pensarmos que a mudança leva tempo e que o cérebro encontra gatilhos e estratégias para mantermo-nos no padrão mais conhecido que temos, mesmo que seja o mais destrutivo. Que errar é humano. Que esta “desculpa” não pode, nem deve servir para sempre, mas ajuda a atenuar os danos colaterais. E até a motivar-nos a fazer melhor.



Até parece que estou a falar de acções complicadas ou de coisas muito sérias. Tipo lobo mau. Não, estou a falar dos nossos erros diários, que parecem pouco, mas que continuam a persistir se começam a parecer com um monstro com mil cabeças. Os nossos nervosismos, o hábito de gritarmos, o Hábito de descontar em quem não merece, o hábito de procrastinar, o hábito de não lutarmos pelo que queremos, de não sabermos perdoar, de não deixar que a vida nos defina a nós, mas nós a ela…

Sim, são hábitos e por mais que de fora pensemos “se são maus hábitos é tempo de os mudar”, também temos de pensar que mudar um hábito demora, leva tempo, necessita de ser contrariado e domesticado. Não é que não tenhamos aprendido com os erros, mas os hábitos são difíceis de alterar.



A silly season pode servir para não pensar em muita coisa e descansar do ano difícil que tivemos. Mas porque não utilizarmos esta altura do ano para pensarmos o que é que andamos a fazer de correcto e de incorrecto nas nossas vidas?

E se Setembro é o tempo dos recomeços, eles não aparecem do nada e não se constroem sozinhos.



Talvez seja a altura certa para entre um mergulho e outro meditar sobre o que temos mesmo de mudar. Para haver mudanças, têm de haver novas acções, novos comportamentos, novas formas de estar na vida. E uma fé inabalável em nós e na ideia de que conseguimos essas mudanças. Com uma dose certa de perdão, uma espécie de shot, que é suficientemente forte para não nos deixar ir abaixo, e suficientemente pequeno, para não nos deixarmos abater demasiado pelos nossos erros. Concluindo, é mesmo importante percebermos o que é que aconteceu para dar errado, em nós e nos outros e à nossa volta (eu não nos quero transformar nos maus da história, mas se não nos puser a olhar para dentro de nós, será tão mais fácil, basta culpar tudo o resto e continuarmos na mesma). É urgente olhar para o que é que deu errado para começar a dar certo.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Há dias em que devia sair vodka do teu chuveiro. Com morango. Ou manga. Ou até laranja. Tanto faz.


Há dias em que tudo corre mal, não há?
E os piores são aqueles imprevisíveis. Em que estás na tua, a desfrutar de uma vida normalzinha, vá, e de repente o céu parece cair-te em cima da cabeça.
E quantas vezes, em vez de arregaçares as mangas só te apetece vestir a tshirt velhinha de trazer por casa, aquela a dizer "Olá, sou miserável" e tapares-te até ao pescoço, fechares portas e correres as persianas até abaixo e esqueceres que a vida existe? Ou melhor; quantas vezes consegues pensar, depois de uma hetacombe,  "que se lixe"?
O problema é que sabes que a vida nunca se vai lixar. Se alguém tiver de se dar mal, esse alguém não há-de ser a vida, pois não? Queria dizer isto de uma forma mais fofinha e serena, mas não sei como. Somos nós que pagamos um preço bem alto por vivermos tudo com tanta intensidade. E isso não tende a melhorar.
E nesses dias, já para não falar dos outros, em que os pequenos ajustes do dia a dia te deixam com o corção a palpitar, a bater mais rápido...aqui simplesmente parece que te vai saltar do peito.
Porquê a mim? Porque é que tudo parece correr mal comigo? É o stress. Esse nosso grande inimigo. Pronto, é isso. Valerá a pena falar mais sobre algo que já usamos como palavra do dia a dia, como se fizessem parte de quem somos, da"la famiglia"?  Bem, tem de se falar. Porque quando começas a sentir isto todos os dias, ou quase todos os dias, por causa do trabalho, por causa da relação com o marido, por causa dos filhos, por causa da falta de tempo, por causa das mil  quinhentas e quatro decisões que tens de tomar quase de seguida...o stress passa a ser crónico e nunca mais te vai largar, por mais que o queiras dar- lhe um grande chute no traseiro. Esse stress mata, deixa sequelas irreversíveis, dá cabo de quem és ou querias ser, da tua auto-estima. Claro que temos sempre a hipótese de ignorar os efeitos desta "pessoinha" miserável  e mesquinha e continuar a viver como se ela não existisse. Mas até quando vamos conseguir aguentar? Se for de quando em vez ainda é possível. Todos os dias? Nem pensar.
O stress pode acabar connosco e é importante que se fale nisto. Porque a medicação não chega para resolver tudo. Embora ajude, se bem administrada, nas doses certas e não para toda a vida.
E se calhar, pode parecer estranho ou até já é algo bastante batido, o stress não existe de facto. Sim, há muitas pessoas que conseguiram e conseguem, efectivamente, passar por aquilo que passamos e lidar razoalvelmente bem com isso, sem o tal Mr Monster, the Stress a atrapalhar.
Isso significa que, depois de tanta coisa, ele não existe? No fundo, a verdade é que não são os factos em sim que são stressantes, mas a forma como os encaramos, como lidamos com eles.
Bem, nem tudo. Há coisas que acontecem porque acontecem e fariam doer a qualquer pessoa, e fariam sentir raiva e o coração com a sensação de que acabou de correr a maratona  de Lisboa, Londres ou Sevilha. Porque é a chamada causa efeito.
Mas no stres há qualquer coisa entre a causa e o efeito, que são as nossas cognições, as interpretações que colocamos naquilo que acontece.
Se formos chamados à escola do nosso filho porque ele faltou às aulas, se batermos com o carro, se a nossa chefe nos ligar a ameaçar que podemos estar quase a ser despedidas...isto só deixa uma mossa valente porque são coisas com as quais nós nos importamos, que mexem connosco, que põem a nossa cabeça num virote a pensar no que vai ou não acontecer a seguir e, quase sempre, a pensar nas piores consequências e na falta de forças e capacidades para lidar com tanta coisa junta. Sem isso não há stress.
O stress aparece da forma como nós lemos e lidamos com os acontecimentos com que nos vamos deparando na vida. São as nossas vozes interiores e a forma como olhamos as coisas que causam a ansiedade, nunca o acontecimento per se. E, mais uma coisa, obviamente que não o fazemos conscientemente. O mais certo e provável e que não nos damos conta é que todo este processo acontece dentro de nós,  que dificulta muito mais as resolução dos problemas porque dificilmente conseguimos pôr a voz da razão a falar mais alto. A voz da razão que ajuda que um problema só seja um problema dentro da nossa cabeça. Mudando a música ou banda sonora que vem nesse momento aos nossos ouvidos, e que muitas vezes custa a desaparecer, tudo muda.
Se queremos mudar a nossa forma de viver temos de deixar de pensar que o stress faz parte do dia a dia da vida moderna.
Quem não se sentiu stressado nos últimos dias ou nas últimas semanas (e já estou a ser condescendente. Devia dizer últimas horas?)? Quem não sentiu medo?
Mais facilmente dizemos que sentimos stress do que sentimos medo, mas no fundo as duas vêm de mãos dadas.
Até o stress que sinto de ter obras no prédio todo o santo dia é uma forma camuflada de ter medo de não conseguir trabalhar em casa, de descansar o suficiente, de estar em paz com os meus filhos. O stress que sinto quando vejo os meus filhos a brigar é o medo que tenho de não me sentir uma boa mãe ou o medo da falta de tempo para eles. E podíamos continuar assim eternamente.
Algum stress é positivo, alguma ansiedade faz com que nos preocupemos e decidamos ser melhores. Mas calma. É preciso meter medo ao medo e dizer que nos estamos a borrifar para uma série de coisas, que somos mais fortes do que isso. Das primeiras vezes vai parecer falso e vai apetecer desistir. Aos poucos vamos sentindo que o coração já não nos quer sair pela boca e que tudo tem, mesmo,  uma solução.
Que a vida não está para nos lixar, que isso é feio demais e não fica bem dizê-lo num texto tão elegante.  A vida está cá para nos para nos pôr à prova. E somos nós que escolhemos a banda sonora, os argumentos, as discussões, o guião...o medo...que passa ou não passa nessa altura pela nossa cabeça. Aliás, pelo nosso corpo todo.
Afinal como diria muita gente, segundo a internet (desculpem, mas não encontrei o verdadeiro autor da frase), para todos os problemas há uma solução. E parar de viver com medo parece-me uma bastante adequada. Tal como aprender a ter a sensação que controlamos o que nos acontece e que não é precisamente ao contrário.  E que facilmente perdemos o controlo sempre que algo mexe connosco.
Se nunca mais vamos sentir medo? Vamos. Se vamos sentir que  perde o controlo de vez em quando não é normal? É.  Se o stress não vai ganhar algumas batalhas? Vai. Que o stress é causado pela forma como nós pensamos e não pelos outros? É verdade.   Mas se não vivermos obcecados com isso a vida ganha um novo sentido. É uma verdadeira mudança de foco. Uma mesmo grande. Talvez a maior proeza seja deixares de sentir que não és uma vítima, a vítima da tua própria vida.  Sentires-te uma vítima é perderes todo o poder que tens dentro de ti. É perderes a força, a auto-estima e até o auto-conceito - saberes quem és e/ou a ideia que tens de ti próprio.
E aproveita para ensinares com palavras, mas principalmente com exemplos, tudo isto aos teus filhos.
E tira um tempo para ti, vai espairecer, beber o tal vodka porque, tal como o céu parece que nos vai cair em cima da cabeça, mas não vai, o vodka nunca sairá pelo chuveiro e te resolverá a vida. A isso cabe-te a ti. Tira a t-shirt, arranja-te, vai beber um copo (que um não mata, nem te fará cair em desgraça) - parece que a bebida da moda já nem sequer é o gin, mas Porto branco com água tónica - e começa a arranjar estratégias para seres feliz.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Quantas coisas más já fizeste na vida?

Eras capaz de ser violento, até de matar, de roubar...
Dentro de circunstâncias atenuantes que até parecem as certas.
No fundo, já pensaste nisto? Até onde eras capaz de ir? Mesmo que só apenas para proteger ou vingar os teus?
No fundo somos assim os seres humanos. Está na nossa natureza. Estará?
Muitos de nós nunca admitiríamos, mas que há um lado negro que todos temos, camuflado, atenuado, culturalizado, domesticado, reprimido por um enorme super ego, lá isso há.
A Psicologia Social mostrou vezes e vezes sem conta que todos, por uma razão ou por outra, somos capazes de passar para o lado mais sinistro, mais negro, se formos levados a tal.
Calma. Então somos todos uns monstros? Já não há cordeiros? Foram todos comidos pelos fortes e grandes lobos maus, sempre à espreita?
Não. Nós também somos capazes de carinho, de empatia, de gestos de caridade, de lealdade, de amor profundo e verdadeiro pelos outros. Muitas vezes por aqueles que nem conhecemos, como tão bem mostrou a tragédia das últimas semanas e tantas antes dessa.
Quando eu era miúda e o meu pai, viciado em westerns, lembro-me de lhe perguntar sempre, até ao ponto de quase o chatear: "Pai, quem são os maus?", para tentar fazer uma separação, para entender a história, que, com a idade que eu tinha, e porque os filmes trabalham muito bem essa questão, era mandatário saber de que lado é que me devia posicionar. Quem eram os bons. E sim, sempre quis ficar do lado dos bons. Chamem-me betinha. Mais tarde, já na faculdade de psicologia lembro-me de ouvir que esse termo se chamava clivagem e que só as crianças e os loucos o faziam. Os outros sabiam que ninguém é só bom ou só mau. Somos uma mistura de tudo o que nos acontece, de todas as experiências que vamos tendo e que ficam presas em nós, desde a infância.
Até aqui tudo bem. Mas será que sabemos avaliar-nos até que ponto conseguimos fazer o bem.... por exemplo, sem olhar aquém, ou fazermos mal se a isso formos levados, forçados ou apenas só porque sim, porque tivemos um dia não e apetece-nos mesmo enviar uma foto comprometedora ou uma piadola a alguém que não gostamos? Quantas e quantas vezes descarregamos as nossas raivas e frustrações nos nossos maridos, companheiros, pais, filhos...

Já não somos mais crianças. Já conseguimos perceber que todos nós, gente mais ou menos normal, sente raiva, ciúme, inveja, sentimentos de inferioridade, orgulho doentio, ganância..
Mas também sentimos compaixão, humildade, empatia, generosidade, amor, confiança, fé, felicidade só por fazer ou mesmo só por ver outros felizes..

Nós somos ambos, os que fizemos o bem e os que fizemos o mal. E por vezes nem pensamos nisto. Mas eles estão dentro de nós, a lutar pelos seu espaço, a vencer as suas dores, a curar os seus demónios.

Quem ganha?

Se eu tivesse a resposta...

Se eu tivesse a resposta talvez dissesse: Talvez aquele que alimentares mais....

terça-feira, 11 de julho de 2017

Como é tão fácil estragar tudo

Se calhar estragamos tudo quando despendemos todas as nossas forças e energias a mostrar aos outros ou ao outro, em particular, como somos bons, engraçados, especiais. Uma necessidade visceral de mostrar que somos melhor do que somos. E não apenas comuns. Porque comum é mau, é a morte do artista. Todos o sabemos.
Também julgamos mal os outros porque ao princípio queremos apenas ver aquilo que queremos ver. Nem mais, nem menos. E não deixamos que os outros vejam em nós aquilo que também somos. Porque ninguém é apenas isto ou aquilo.
E porque é que ficamos tão zangados e magoados e vamos perdendo o encantamento quando a pessoa mostra aquilo que sempre lá esteve, mas que não quisermos ver, ou que pela confiança e à vontade foi-se mostrando pouco a pouco?
Para nós essa pessoa perdeu a magia…mas será que conseguimos alguma vez entender que está a acontecer exatamente o mesmo com ela? Tudo o que fomos colocando atrás do ecrã vai potencialmente tender a descer e apercebemo-nos que o outro não é perfeito. Mas porque seria? Nós somos? Não, de todo. Ninguém é.
E estamos tão presos às crenças iniciais que muito dificilmente conseguimos soltar-nos da perfeição que esperávamos daquele com quem escolhemos ficar e o vemos apenas como uma pessoa, com qualidades e defeitos, com partes divertidas e outras aborrecidas, com momentos de muita alegria, mas também outros de muita tristeza. A tal bagagem que todos trazemos connosco e que se vai mostrando pouco a pouco.
E se aos 20 essa bagagem já pesa, mas é ainda bastante leve…o que dizer quando é uma bagagem que carregamos connosco há 40 anos, por exemplo?
Não é por mal. É porque queremos a perfeição, o amor especial, a vida que sentimos que merecemos viver, como a dos contos de fadas que nos contaram em crianças e que nós acreditámos. Como aceitar que não é assim? Que as princesas e os príncipes também podem ser neuróticos às vezes e que talvez até vamos conseguir encontrar no outro algumas das características que não gostamos em nós?
Não é por mal, mas no fundo somos profundamente egoístas quando não nos conseguimos descentrar do queremos ou queríamos ser ou ter ou alcançar… E desistimos. Simplesmente desistimos.
Pergunto-me se investimos mais em nós, num falso nós, do que propriamente na relação e no descascar as camadas que todas as relações vão tendo?
E quando percebemos isso já arruinámos tudo. Porque sim, se por vezes pode não ser tarde demais, outras vezes pode.

domingo, 27 de novembro de 2016

A difícil arte de começar de novo – parte III


Na parte I falei sobre o divórcio e sobre a necessidade de deixar o passado bem resolvido para se poder seguir em frente. Na parte II dei algumas dicas de como se deve viver a nova relação. A parte III dedico-a à questão: e quando há filhos?


Obviamente que é muito importante que os filhos aceitem o novo relacionamento da mãe (ou do pai), mas não podem ser eles a ditar as regras ou ter a última palavra sobre esta tão grande decisão.

Se não entramos numa nova relação por causa dos filhos, ou até se terminarmos a relação por causa deles, porque não aceitam, porque não querem, porque boicotam, ou porque temos medo que tudo isto os afecte, vamos mais cedo ou mais tarde responsabilizá-los por essa escolha, geradora de infelicidade.

Portanto, antes de achar que tem de optar pelos filhos em detrimento de um novo amor, porque os filhos estão primeiro do que tudo, porque já sofreram muito e não merecem sofrer mais… pare, respire e pense. Os filhos vão acabar por aceitar. Dê-lhes tempo, siga alguns conselhos que aqui vou deixar e, sobretudo, não desista. E também não sinta culpa. A verdade é que não está a fazer nada de errado.

É natural que os filhos tenham medo. Depois de tudo o que falámos, consegue dizer que também não tem? Tem, claro que tem. E, no entanto, é adulta e racionaliza as coisas de forma diferente de uma criança ou de um jovem. Os mais novos não têm a facilidade de um adulto de verbalizar o que sentem, até porque alguns sentimentos são inconscientes, logo, impossíveis de serem pensados.

Não vamos dourar a pílula. Não é fácil, não é tarefa simples…ou pode não ser. Mas é um processo natural e é compreensível e mesmo imprescindível que haja muito empenho da parte de todos, especialmente dos adultos envolvidos.

Por exemplo, os filhos, principalmente os mais novos, podem sentir medo de serem substituídos no coração da mãe ou do pai. Sentem medo de perder o seu amor. É extremamente importante que os pais expliquem aos filhos que o que sentem por eles não vai mudar, nem vai diminuir ou passar para outra pessoa. O amor divide-se entre todos, ou multiplica-se. É elástico. É como um polvo cheio de tentáculos. Ou uma mãe com muitos braços.

Nesta fase, os filhos precisam mais ainda de atenção. Por isso, terá de se desdobrar, dedicando-lhes tempo em exclusivo…e o mesmo acontece com a nova relação. É cansativo, é complicado e é difícil…mas tudo se consegue quando se faz com o coração.

Também é importante que a introdução do novo elemento seja feita de forma gradual. No início os filhos não devem ser envolvidos. Deixe passar algum tempo, deixe que haja mais certezas e que tudo se torne mais sólido. Aí será a hora de agir. De forma tranquila e em pequenas doses. 

Os primeiros contactos não devem acontecer em casa, mas sim em espaços neutros. De preferência organizando actividades que sejam divertidas para as crianças. Antes de tornar tudo oficial, procure pensar e organizar programas que sejam estimulantes e cheios de boa disposição. Isso ajudará mais do que pensa, porque as crianças começam a gostar daquela pessoa, a gostar da companhia dela, sem o peso de ser o namorado/a da mãe ou do pai.

Então estará na hora de contar e não se admire se, a princípio, e mesmo com pezinhos de lã, for ainda tudo um pouco confuso na cabeça deles. Vai levar algum tempo para que todos se adaptem à nova situação.

Quando contar aos filhos, ouça-os. Nessa altura e sempre. Ouça-os atentamente, coloque-se no lugar deles, seja compreensiva e respeitosa. Os filhos não vão decidir o futuro dos pais, mas é mesmo muito importante que se sintam escutados. Pedir aprovação ou conselhos poderá ser tentador e, num primeiro impacto, pode até parecer reconfortante para as crianças, mas pense que está a passar para eles uma responsabilidade que não devem ter e para a qual não estão preparados. Portanto, ouça-os, faça-os sentir especiais, por serem escutados, mas as decisões e as escolhas são sempre suas, não deles.

O novo elemento também terá de se empenhar e trabalhar para que os laços se construam, para que a relação com as crianças funcione e também para que a relação entre o casal se torne segura, sabendo que há um terceiro elemento, sempre presente, mesmo quando não está, que são os filhos. É preciso jogar entre proximidades e distâncias, essencialmente usando o bom senso. E a paciência. Esta tem de ser uma das peças chave.

Lembre-se que também para a outra pessoa não será fácil. Também terá medos, também não conseguirá adivinhar como a criança irá reagir, o que irá sentir, se a aceitará.

Queremos que corra bem, mesmo muito bem. E pode, de facto, correr muito bem, melhor ainda do que o esperado. Mas não alimente o desejo de que para o seu filho ou filha, o seu namorado seja um pai daqueles instantâneos, como se saísse na farinha Amparo. Mais ainda se os seus filhos já tiverem um pai. Aqui para nós, também não ia querer que a namorada do seu ex. fosse vista pelos seus filhos como uma mãe, pois não? Mãe há só uma. Mas o novo elemento pode ser uma pessoa importante na vida deles e vai com certeza reconfortá-la saber que ela os trata bem e que gosta deles de verdade. Terá é de saber gerir os ciúmes e aceitar a realidade. Mais uma vez a mesma ideia: ninguém vem substituir ninguém. Vem somar afectos, não diminuir. Se houver amor, carinho, respeito pelos limites, há espaço para todos. Porque relações saudáveis e pessoas que nos querem bem, nunca são demais.

Se o seu namorado também tiver filhos, nunca, mas nunca deve entrar em comparações sobre os rebentos de um e do outro. Nunca deve criticar os filhos dele ou a forma como ele os educa, ou até como a ex. dele, a mãe dos filhos, os educa. É um terreno de areias movediças. Muito cuidado!

E por falar em exs., é bom que todos os exs. (sim, todos) respeitem as novas relações. Quando ainda se gosta sente-se ciúmes. Quando já não se gosta continuam a sentir-se alguns ciúmes. E por vezes por despeito ou só porque sim, dizem-se coisas em frente aos filhos, que nunca se diriam, se a razão não andasse completamente toldada.

De facto, é uma fase da vida em que esquecemos a sensatez, disparamos para todos os lados, atropelamos os dias e quase parecemos bonecos desarticulados. Mas Roma e Pavia não se fizeram num dia e a adaptação a novas reconfigurações familiares também não. E dão trabalho. Oh se dão! Mas as coisas são mesmo assim, há uma certa fatalidade nisso. No entanto, também acredito, e isso é mesmo bonito, que no fim somos nós que escolhemos, somos nós que decidimos se continuamos ou atiramos a toalha ao chão. Somos nós que decidimos se depois de toda a tormenta e dos invernos da vida, estamos novamente prontas para a bonança e para os dias soalheiros de verão.

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

A difícil arte de começar de novo – parte II



Depois de uma separação, de um divórcio, ou de uma crise de vida, passamos por momentos tumultuosos e desgastantes, até sentirmos que estamos prontos para começar de novo. Há quem tenha a certeza de que nunca mais vai querer passar pelo mesmo outra vez, começar do zero, ou voltar a amar. Há quem confesse ter medo de ficar sozinho ou que mais ninguém se interesse por si, ou ache que vai ser muito complicado por causa dos filhos, ou tudo junto… – e a verdade é que se não é a vida a boicotar-nos, somos mestres em fazê-lo a nós mesmos. 

É normal haver medos e dúvidas, mas são tantas as questões que surgem, que ficamos exaustos só de pensar no que vem pela frente. “O que é que os outros vão dizer?”, “Será cedo demais?”, “Como é que as crianças vão reagir?”, “Estarei apaixonada ou apenas carente?”, “E se correr mal?”… É normal colocarmos questões, é normal ter dúvidas, é adaptativo o medo do desconhecido, do re-começo. Torna-se desadaptativo se nos congela, bloqueia, paralisa e não nos permite seguir em frente.

Um grupo de especialistas criou uma fórmula que aponta mais ou menos para o tempo certo para re-começar. Dizem eles que é um mês de espera por cada ano da relação que terminou. Ou seja, 5 anos de relação equivalem a pelo menos 5 meses de espera até estar pronto para começar de novo. Esta é, pelos vistos, uma fórmula matemática, mas não será de certeza uma fórmula mágica que resulta para todos. De qualquer modo é interessante pensarmos nisto.

Quando sentimos que podemos re-começar, que a vida nos está a dar - e nós próprios nos estamos a dar - uma oportunidade de voltarmos a ser felizes é quando deixamos de estar demasiado presos a lembranças, dúvidas, ressentimentos…ou devia ser. Por isso, e tal como foi referido na parte I, é preciso dar tempo, para que o passado fique no passado, para que o perdão aconteça, para que nos encontremos e nos sintamos realmente bem connosco próprios, sem precisarmos de mais ninguém. Estamos prontos para ter outra pessoa na nossa vida quando não precisarmos dela. Faz sentido?

O medo do vazio, do silêncio, da solidão, torna-nos frágeis e mais dependentes. Quando nos fortalecemos e nos tornamos mais autónomos e mais seguros, aí sim, estamos prontos. Embora a vida toda tenhamos ouvido que “a dor da perda de um grande amor se cura com outro grande amor”, temos de perceber e aceitar que não é um novo amor que nos vem salvar de nós mesmos, não é um novo amor que nos vem completar. Quando ele chegar já temos de nos ter salvo. Somos nós os nossos próprios bombeiros. Os nossos apaga fogos. Os nossos salva vidas.

E para isso é preciso trabalhar, trabalhar, trabalhar. Trabalhar a tolerância à frustração, a tolerância à mudança, a capacidade de adaptação a novas situações; trabalhar para estabelecer expectativas mais realistas, para mudar comportamentos e atitudes. Em suma, trabalhar o nosso novo Eu.

Saber o que se quer, o que não se quer, o que se idealiza e ter o passado resolvido são passos essenciais para não repetir o mesmo guião no novo relacionamento. De facto, saber o que realmente queremos, o que nos faz felizes; saber também o que precisamos mudar em nós para podermos viver uma nova relação com futuro; sentirmo-nos preparados para aceitar alguém real, diferente das nossas expectativas e idealizações, diferente do que somos e do que o outro era; aceitarmos que quem vem é um ser humano também com alguns defeitos; aceitar que é impossível mudar seja quem for a não ser nós mesmos; não desejarmos substituir ninguém; não entrarmos em comparações e cobranças; não termos medo de mudar, mesmo que seja doloroso,tudo isso são tarefas-chave desta nova fase da vida.

Nós funcionamos inevitavelmente por substituição. É comum que o novo amor seja alguém com características, físicas e/ou comportamentais semelhantes àquele que se foi. Seleccionamos alguém que pareça corresponder às nossas idealizações, sobretudo quando o outro imaginário continua presente. Temos tendência a comparar, cobrar e exigir que quem chega supere e cure todas as feridas e, assim, mais uma vez podemos correr o risco de não estar a ver a pessoa real, mas a que imaginámos, a que só existe na nossa cabeça. E podemos correr o risco de repetir os erros que cometemos no relacionamento anterior. É muito importante confrontarmo-nos com isto para que aceitemos que a pessoa que vem não tem de ser mais ninguém a não ser ela própria. Não há pessoas iguais, somos todos diferentes. E se não há pessoas iguais e esta nova pessoa é única, não a podemos amar da mesma maneira que amámos o nosso antigo amor. Temos de encontrar novas formas de amar, novas formas de nos relacionarmos e procurarmos não trazer demasiada bagagem para o presente. Por mais compreensivo que o outro seja pode sofrer, ressentir-se e até saturar-se. 

Reinventar-se é a solução. Repensar a própria identidade. Criar uma nova pele. Reconstruir-se. Mas não podemos esquecer que existem forças psíquicas que vão procurar fazer com que tudo permaneça na mesma. Porque mudar dói. Queima como ferro em brasa. Mesmo quando mudamos para melhor. 

Seja um amor definitivo ou um amor de transição – sim, aceite também que pode não ser o amor da sua vida e não há mal nenhum nisso – permita-se vivê-lo como uma nova oportunidade e com muita intensidade. Por isso aproveite, aproveite muito. Começar de novo tem coisas tão boas! Ainda se lembra do que é sentir um friozinho na barriga ou borboletas no estômago?



E depois de passarmos as passas do algarve não merecemos alguma paz, com agitação positiva? Agora sabe o que quer, mas também sabe que não vale a pena aborrecer-se por coisas que não merecem, que nem passam muitas vezes de ninharias. Saiba escolher as suas batalhas, aceite que nenhum relacionamento é perfeito e prefira ser feliz a ter sempre razão.



Espero que tenham gostado. Na parte III falaremos da nova relação e no envolvimento dos e com os filhos.





domingo, 23 de outubro de 2016

A difícil arte de começar de novo – parte I


Um dos pilares de apoio ou sustentação do ser humano é a relação que ele mantém com os outros. De facto, não fomos feitos para ficar sozinhos e quando acontece uma separação temos uma necessidade vital de fugir do vazio que se instalou bem dentro de nós e que não foi apenas causado pela ausência daquele com quem partilhámos a vida, mas por todos os sonhos desfeitos, por todos os projectos e planos que ficaram por realizar.

Aceitar que tudo mudou e seguir em frente exige uma determinação e coragem épicas. Lidar com tantos sentimentos, muitos deles contraditórios – raiva, negação, culpa, tristeza, saudade – vira a nossa vida de pernas para o ar e quando se misturam é como se tivéssemos caído mesmo no olho do furacão, com ventos de 185 km por hora. 

O fim de uma relação é como um luto que se faz, que leva tempo, que deixa marcas e que faz mossa. Que condiciona tudo o que vem a seguir. Começar de novo é difícil, é algo que pode demorar e não deve ser apressado. É uma conquista que não acontece de um dia para o outro, mas terá de começar algum dia e por algum lado. Então que comece por nós, num olhar para dentro, num trabalho solitário, dorido, mas necessário, para que o fantasma do passado não crie uma sombra sobre o futuro. 

A ansiedade de se estar só pode-nos levar a escolhas não reflectidas, pode atirar-nos para um novo relacionamento antes de estarmos prontos, antes de termos feito a catarse ao relacionamento anterior. Então, antes de escrever sobre o novo relacionamento (parte II), será importante pensar sobre o que estamos a deixar para trás.

Tenhamos a idade que tivermos, um divórcio obriga-nos a crescer, de repente, de forma dolorosa, porque a vida não espera. As tarefas repartidas passam a ser só de um e temos de aprender a ser independentes, a viver sozinhos, a fazer coisas que para o outro eram simples, mas que o não são para nós Aceitar perante todos o novo estatuto, dar ou não dar explicações, responder ou não a perguntas indiscretas, ter vontade de desaparecer…mas continuar. Isto é crescer e é assustador.

Mas crescer é também responsabilizarmo-nos pelo porquê de a relaçãonão ter resultado. É necessário reflectir sobre isto a sério, enquanto ainda lambemos as feridas. Fosse qual fossea tomar a iniciativa de pôr um ponto final, é importante pensarmos sobre o que fizemos e não fizemos e não só sobre o que o outro fez, não fez e deveria ter feito. Será que compreendemos realmente porque é que não deu certo?

A ideia não é de todo reacender mágoas e encontrar culpados ou bodes expiatórios. É necessário parar de alimentar pensamentos destrutivos, culpabilizantes, vitimizadores, que não deixam seguir em frente. E a ideia é mesmo seguir em frente. Pensar sobre isto para aprendermos mais sobre nós e reaprendermos a ser felizes. Não é ficar preso à dúvida, agarrados com unhas e dentes ao questionamento permanente: “”Onde foi que eu errei?”, “Onde foi que eu errei?”, “Onde foi que eu errei?”, “E se eu tivesse feito diferente?”. 

As respostas podem demorar. Podem até nunca chegar. Não se atormente. Aceite que a vida tal como a conhecia mudou, diga basta à raiva, afaste-se da culpa e de todos os sentimentos negativos. E se for necessário lute. Lute até sentir que esgotou todas as hipóteses de recuperar o que já foi perdido.

Faça o luto à relação, às idealizações, às expectativas. Numa relação, o outro não é apenas o outro. O outro divide-se entre o outro real e o outro imaginário. Aquilo que ele é e aquilo que sempre desejámos que fosse. É muito comum que haja discrepâncias entre eles, porquenós idealizamos muito. Idealizamos e internalizamos o outro dentro de nós de acordo com as nossas necessidades, expectativas e percepções. E quando nos separamos, separamo-nos do outro real e a fantasia demora a desaparecer. Crescer também é parar de confundir idealização com realidade.

Não mate o amor. Nem mate o passado. Ao amor deve dar sempre mais uma oportunidade, quando a altura certa chegar. Ao passado deixe-o simplesmente onde ele pertence, no passado. Retire fotografias, objectos, roupas que tragam à memória aquilo que não é tempo para ser lembrado. Faz sentido manter as lembranças longe da vista e longe do coração (claro que quando há filhos deve deixar algumas lembranças do pai nos quartos das crianças). Se ainda existem objectos do outro lá por casa, é porque ainda não sente que consegue fazer este corte. Mas renovar é preciso. Não é tolice quando se aconselha a redecorar a casa, mudar de corte de cabelo, substituir o guarda-roupa, ou algumas peças, ir para o ginásio, fazer coisas novas. Mudar ajuda a partir para uma nova fase da vida, de nos redescobrirmos, de resgatarmos uma identidade pessoal e social muitas vezes perdida, de reconquistar a felicidade.

Quando a separação psicológica acontece, - porque a separação física é apenas uma das etapas e euma separação efectiva requer uma separação psicológica – vai conseguir retirar a importância que colocou no outro, vai conseguir enterrar os mortos, mesmo que eles ainda estejam bem vivos.

E um dia vai conseguir fazer as pazes com o passado, vai deixar de pensar nos anos de vida que perdeu e no que deu de si sem valer a pena. Um dia talvez consiga acarinhar os momentos bons e pensar que se no fim deu errado, em algum momento do caminho deu certo. Como li algures “Se o amor não deu em nada, não se engane, deu amor”. Faça-o por si, para que o rancor, a raiva, os remorsos possam desaparecer. Perdoar é seguir em frente. Perdoar não é esquecer.

Aceitar que nem tudo foi mau não é querer voltar a uma vida que já ficou para trás, que embora conhecida, não foi o que sonhou para si. É seguir em frente, rumar ao desconhecido, começar de novo, com toda a coragem que vai conquistando pelo caminho, sabendo que não quer ser quase feliz ou ser feliz só um pouco, ou às vezes, ou mais ou menos.






domingo, 9 de outubro de 2016

O que é isto da inveja ou será que a galinha da vizinha é mesmo melhor do que a minha?


Sei, à partida, que, ao bordar este tema, vão surgir comentários do tipo: “Deve julgar-se mesmo importante, coitada”, ou “Mas ela pensa que tem alguma coisa que valha a pena ser invejada?” (tal como disse a Sónia Morais Santos há uns dias, parece que as bloggers “têm a mania de medir tudo pela inveja”) – mas a verdade é que esta questão é recorrente e por isso corro o risco e quero mesmo deixar esta reflexão em jeito de crónica.

Começo por confessar que, ao longo da minha da vida tenho sentido algumas vezes o sabor amargo da inveja. Ou porque sempre fui boa aluna, ou porque mais tarde criei a família que muitos consideravam perfeita, ou porque com 4 filhos conseguia conciliar, aparentemente muito bem, a vida pessoal, com a familiar e com a profissional. Mesmo quando tudo mudou e o meu projecto de vida terminou e eu passei um mau bocado, continuei a ouvir falar de invejas. Desta vez é porque achavam que tinha dado a volta à situação e tinha até, imagine-se só, conseguido mais tempo para mim. Até uma querida amiga acabou por me confessar que gostava de estar no meu lugar, que só mesmo se se separasse é que ia conseguir voltar a sentir-se pessoa, para além de mulher e mãe. Também me aconselharam a não falar sobre a minha vida relacional, quando reencontrasse o amor – “Há muita inveja por aí!” – e também associaram os episódios menos positivos que me iam acontecendo ao mau olhado, olho gordo ou mal de invejas. De facto, até o senso comum aconselha: Se estás bem não fales nisso.

E eu como sou do contra, achei que estava já na hora de falar sobre este tema tabu, talvez o grande não dito dos nossos tempos, mas de que todos já mais ou menos provámos o sabor amargo ou já sentimos na pele as ferroadas, bem piores do que as de um lacrau. É provavelmente o sentimento mais mal visto e dos mais antigos da Humanidade – de Caim a Abel, às madrastas más da Branca de Neve e da Gata Borralheira, a Mozart que foi alvo da inveja do compositor italiano Satieri, às obras de Shakspeare, aos filmes, séries ou telenovelas mais actuais, a inveja sempre esteve presente e, se por um lado ela é ocultada, por outro é caracterizada como fazendo parte da vida. A realidade é que a inveja é natural e está presente nas relações humanas, está presente no nosso quotidiano, mesmo quando não conseguimos admitir que lá está.

Porque é que sentimos inveja ou porque somos invejados?

Sentimos inveja porque comparamos e, muitas vezes, quando comparamos invejamos e com a inveja vem o ressentimento e a frustração de não conseguirmos o mesmo, de não sermos assim, de não termos as mesmas coisas. A questão é que só sentimos inveja porque nos falta uma grande dose de amor próprio para nos sentirmos felizes com o que temos e competências para conseguirmos também bons resultados para nós, sem termos de passar por cima de ninguém. O sentimento de inferioridade é um veneno que nos vai corroendo por dentro.

Está patente na vida de todos nós este padrão e o que é preciso é saber como geri-lo – comparações, competições, rivalidades. Podemos até falar em desamor social. Crescemos com a ideia de termos de ser os melhores, que não podemos deixar ninguém passar-nos à frente. A competição é uma característica humana que sempre esteve e vai continuar a estar presente na nossa sociedade.

Nós conhecemo-nos e percebemos do que somos capazes através do outro, através da tal comparação que fazemos. O curioso é que o processo começa por ser de identificação e de admiração. Eu só invejo o que admiro, mesmo que não admita isso, nem sob tortura. Eu admiro, mas em vez de ficar feliz pelo outro e lutar para conseguir também bons resultados, passo a desejar o que o outro tem, o que o outro conseguiu, o que o outro é. E em vez de lutar pelos meus objectivos, diminuo-me, invejo e desejo até que o outro perca o que possui. Pelo caminho ainda troço do que o outro é, humilhando-o, muitas vezes de uma forma indirecta, desvalorizando os seus feitos e até “roubando”as suas ideias.

Esta inveja surge da observação das nossas próprias limitações ou da percepção errada dessas limitações. Muitas vezes parece que não fomos competentes, mas a nossa maior dificuldade foi “simplesmente” a de escolher adequadamente metas, traçarmos objectivos possíveis de alcançar. E em vez de procurarmos olhar para as coisas desta forma, continuamos a desejar o que o outro tem, em vez de mudarmos as nossas percepções, adaptarmos metas e valorizarmos o que já conseguimos atingir, procuramos sobretudo fora de nós, quando o caminho passa por olharmos para dentro. Vive-se focado no que falta e não no que se tem.

A inveja revela muito mais sobre o invejoso do que sobre o invejado. Revela medos, incapacidades, percepções distorcidas. Como mostra a palavra, inveja vem do latim in-evidere, que significa não ver ou ver enviesado. Vemos com uma lente de aumento o que o outro tem e utilizamos a mesma lente para ver o que nos falta. Então, será que a galinha da minha vizinha é mesmo melhor do que a minha? Depende tudo da nossa percepção.

Há quem fale em inveja boa, inveja branca. Temos tanto medo da inveja que quando a sentimos, sentimo-nos obrigados e reforçar que é do bem. Sim, a inveja pode ser boa, mas também há quem diga que se for boa não se pode/deve chamar inveja, tal é a carga negativa que carrega.

Se tomarmos alguém como referência, se tivermos alguém como modelo, se essa pessoa nos motivar, se ao nos compararmos nos sentirmos estimulados a sermos melhores, se nos tornarmos mais criativos… isso só pode ser bom. Nos primórdios da evolução a inveja teve um papel importante. Desejar o que o outro conseguia era um indicativo do quanto era possível conquistar. Se um macaco conseguia dois cachos de bananas e outro conseguia cinco, o primeiro macaco percebia que também ele podia conseguir uma quantidade maior. Isto estimulava a competição, competição esta que ajudou na evolução da espécie.

Daí que possamos dizer que a inveja é um dos sentimentos mais antigos e primitivos. Segundo os psicanalistas, até o bebé sente inveja da mãe porque é dependente dela, porque o alimento provém da mãe e não está sempre ao seu alcance. Pode mesmo recusar o peito como retaliação. O bebé precisa então de tolerar as frustrações para que cresça saudável. E fundamentalmente é o que todos que sentem inveja precisam. Tolerar as suas frustrações, olhar para si mesmo e descobrir potencialidades, recursos, formas de ficar e ser feliz. A inveja tem cura.. E o primeiro passo é assumir-se que se sente inveja. Ao fazê-lo esta perde a força demolidora que tem. Podemos continuar a admirar o outro e as suas capacidades, sem querer que algo de mau lhe aconteça ou que perca o que conseguiu atingir.

Deixamos de sentir inveja quando sentimos gratidão. Gratidão pelo que se conseguiu alcançar, pelo que a vida nos deu, aceitando também que ela não é perfeita. Usufruímos da vida que temos quando deixamos de viver a ilusão de que só seríamos felizes de outra maneira. Então a chave é aceitar, conviver bem com a realidade, em suma, gostar da nossa galinha!

O facto de nos compararmos não tem de ser mau se nós, pais, educadores, adultos em geral, soubermos que uma pressão desmedida e que uma visão destorcida da realidade podem tornar as nossas crianças infelizes e escravos de eternas comparações. Mas tal como referi, a comparação não tem de ser má. Um estudo realizado pela Associação Americana de Psicologia mostra que quem tem a oportunidade de ver alguém a realizar uma tarefa, consegue ter ideias novas, ser mais ousado, mais criativo, mais flexível do que aqueles que não observaram ninguém a praticar as mesmas actividades antes de si próprio. Agora, é importante nunca nos esquecermos que não somos todos iguais. Se há os que se sentem estimulados com a competição, há aqueles que sofrem muito com isso.

Então, tal como a raiva, o medo, a tristeza, a inveja pode ser um sentimento que nos ajuda a viver e a progredir, se em doses moderadas. A solução é aprender a dominar as emoções e viver concentrados no crescimento pessoal, no desenvolvimento da auto-estima e ainda inspirando-nos no que se passa à nossa volta. Se o que cobiçamos nos destrói, o que admiramos constrói-nos.

E o invejado? Há algo que ele possa fazer?
Quem é invejado sente-se vulnerável e essa é a sua fragilidade. Acreditar no poder da inveja, acreditar que a inveja pode prejudicar é colocarmo-nos numa posição de medo, de profecia que se auto-cumpre – vamos estar sempre a pensar que aquela vitória ou aquele acontecimento positivo vai acabar a qualquer momento e acabamos por agir em conformidade. Acreditar que os outros têm tanto poder, limita a nossa vida. E depois, se algo de mau efectivamente ocorre vamos sempre achar que foi por algo que nos fizeram – se atribuímos a nossa felicidade a nós mesmos, então também devemos atribuir os nossos infortúnios aos nossos actos, porque nós somos responsáveis pelo que nos acontece. Cada um é sobretudo responsável por se deixar influenciar por sugestões, opiniões ou sentimentos dos outros. Por mais que nos custe aceitar, nós é que acabamos por alimentar os sentimentos negativos que outras pessoas possam ter em relação a nós. Então a receita continua a mesma – concentre-se no positivo, concentre-se em ser feliz!



Para finalizar, como é que podemos saber se alguém é mesmo nosso amigo ou se no íntimo morre de inveja da nossa vida? Se pensarmos bem, vamos conseguir concluir que não é só nos maus momentos que se vê quem está efectivamente ao nosso lado, quem é verdadeiro, genuíno, amigo. Os verdadeiros amigos são aqueles que vibram com o nosso sucesso, com a nossa felicidade. Aqueles que ficam contentes por nos saberem bem, que ficam felizes por estarmos felizes, que querem para nós simplesmente o melhor.



quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Perda gestacional







Um sonho que se desfaz. O que fazer depois disto?

Falar de perda, de qualquer perda, é muito difícil.

Mas ainda há tanto para relectir.

Quando acontece uma perda, qualquer perda, é muito importante haver possibilidade de nos despedirmos, como forma de entender o significado e processarmos e elaborarmos a perda.

Um sonho que se desfaz. O que fazer depois disto?

É importante termos uma atitude transformadora perante a dor - o que muda, o que pode mudar é a forma de lidarmos com a perda. A dor nunca vai passar.

Falar de perda, de qualquer perda, é muito difícil.

Meu Deus, como é importante que todos percebam que perder um filho dói, mesmo que não chegue a ter vivido fora da barriga.



Maravilhoso documentário...não deixem de ver.




terça-feira, 20 de setembro de 2016

A capacidade de estar só ou como lidar com a solidão



Estamos sempre em rede e afinal estamos quase sempre sozinhos.

Há dias li um comentário de uma amiga virtual que dizia que ninguém se devia fiar no número de amigos do facebook – o mesmo é dizer que o número de amigos do facebook não é indicador de uma rede de suporte consistente no mundo offline. Foi só um comentário que alguém deixou a alguém, mas para mim tocou numa questão sobre a qual tenho reflectido bastante e trocado impressões com os meus botões.

A verdade é que estamos na era do “ao alcance de um toque”, mas estamos cada vez mais sozinhos.

Quando comecei a minha relação, que passou a casamento e terminou em divórcio, estávamos ainda a anos-luz da realidade actual. Eu ainda tinha uma máquina de escrever em casa… Por amor de Deus! Depois passei para computador, mas sem internet e quando voltei a ficar solteira, muitos anos depois, o mundo tinha mudado – internet, facebook, instagram, twitter, touch, ipodes, ipads, iphones, chats – e nada mais seria igual.

“No meu tempo” não estávamos à distância de um toque, mas também não havia tantos mal entendidos: porque se está online, porque não se está online, porque não respondeu ainda à mensagem enviada, porque aceitou um pedido de amizade de x, porque enviou um pedido de amizade a y… Podia haver outros temas, mas estes não havia de certeza. Isso quer dizer que os desaguisados modernos são apenas frescuras dos tempos que se vivem? Frescuras ou não – não me parecem frescuras, porque quanto a mim este assunto é sério – são, sem dúvida fruto da era em que vivemos. E isso assusta um bocadinho…

Não sei se antigamente era melhor. Era sobretudo diferente e temos de pensar nisto para podermos agir, para podermos retirar o que de bom a vida online nos trouxe e tentar de alguma forma contornar os problemas que também nos trouxe. E são muitos, de facto.

Antigamente estávamos mais sozinhos…mas sentiamo-nos menos sós. Parece paradoxal, mas faz sentido, se pensarmos bem. Antigamente sabíamos esperar, sabíamos lidar com a espera, sabíamos lidar melhor com as frustrações, com a solidão, as rotinas e com a presença do outro, quando ela existia. Podíamos passar mais tempo sozinhos, mas as relações eram mais vividas presencialmente. Agora está-se quase sempre presente na vida do outro, mas efectivamente isto é um engano, uma ilusão.

Fala-se muito da falta de toque, do viver por trás do ecrã, de coleccionar relações em relativamente às quais não nos entregamos totalmente, tudo para explicar as grandes neuroses dos tempos em que vivemos

Eu vejo a vida actual de uma forma um pouco diferente.

Vê-se mais, exige-se mais, controla-se mais… e não sabemos lidar ainda com isso. Estamos mais contactáveis, o que pode ser bom, mas isso é válido para todos, o que leva a mais ciúmes, mais controle, mais obsessões, mais depressões…porque percebemos que no fundo não controlamos praticamente nada e a vida escorre-nos por entre os dedos. A verdade é que nunca controlámos, mas antigamente não tínhamos tanta percepção disso quanto agora. Não conseguíamos chegar ao outro tão facilmente, ele não estava tão acessível, mas também não estava acessível a ninguém, quanto muito aos colegas de trabalho – as infidelidades estavam quase todas associadas ao trabalho e agora há um sem número de novas possibilidades. Agora, as pessoas estão acessíveis praticamente 24 horas por dia e chegam em segundos a qualquer parte do mundo.

Já li artigos que referem que agora somos todos mais fracos, que nos escondemos atrás dos écrans, que os laços criados não têm consistência e que podem ser facilmente desatáveis, mas, no meu ponto de vista, somos todos mais fortes para conseguir sobreviver nesta enorme selva tecnológica, em que a segunda pergunta, depois do “Como é que te chamas” é “Tens facebook?”.

Temos de ser fortes porque temos de confiar mais no outro, na relação e em nós próprios. Temos de trabalhar cada vez mais a capacidade de estar sós, quando o outro está mesmo “ali ao lado”. Tem de se confiar que, mesmo com tantas mudanças a acontecerem simultaneamente, nada vai mudar irremediavelmente no minuto a seguir. Temos de ter essa segurança. As pessoas ainda gostam uma das outras à boa maneira de outros tempos e temos de acreditar piamente nisso.

O bicho papão é a solidão que sentimos e os aliados da solidão são vários, principalmente o medo de sermos trocados, de não sermos suficientemente bons para mantermos uma relação que perdure no tempo, o medo de não conseguirmos preencher o vazio que sentimos e de não termos resposta para tantas dúvidas que nunca poderão ser respondidas. E se a solidão é o bicho papão e o medo o seu grande aliado, o antídoto está no salto de fé que temos de dar. Temos de acreditar, continuar a acreditar, não parar de acreditar. Mas acreditar no quê? Na integridade, na verdade, na bondade das pessoas, na solidariedade, na capacidade de amar os outros e sobretudo a nós mesmos, na capacidade de aceitarmos que não somos donos de nada nem de ninguém, de que ninguém verdadeiramente nos pertence, na capacidade de aceitarmos que a vida é feita de escolhas, de escolhermos parar de nos sentirmos ameaçados, na capacidade de pararmos de controlar o outro, de sabermos esperar, de aprendermos a desligar.

Quando decidirmos lutar por nós, vamos treinar a possibilidade de desligar, de relativizar, de sermos mais calmos em relação ao que nos rodeia, às pessoas, coisas e circunstâncias, fortalecemos o amor-próprio e a capacidade de estarmos sós. Aprender a desligar na era dos mil olhos abertos dia e noite parece uma inconsistência, mas talvez o caminho seja mesmo por aqui. Só podes estar verdadeiramente conectado a alguém, criar laços consistentes, se aprenderes a desligar.

Back to basics. Ah pois é! Achas que consegues?



quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Sexo...and it's just fine



Depois de ter escrito este post (e mais este, já agora), nunca mais se falou de sexo por aqui. Hoje é o dia.

Na última vez em que se abordou este tema, uma pergunta ficou no ar: 

Se há amor, forçosamente há desejo? 


Começo por vos apresentar Esther Perel, terapeuta de casal e autora do bestseller Sexo no Cativeiro, que centra o seu estudo na psicologia por trás do sexo.

Esta reflexão surge precisamente a partir de leituras e visualizações que fiz de textos e vídeos desta autora.

No ideal romântico que temos hoje em dia sobre as relações a dois, queremos que uma só pessoa preencha todas as nossas necessidades,que seja um tapa buracos para resolver situações para as quais noutros tempos seria preciso "toda uma aldeia”.

A terapeuta faz-nos pensar sobre o paradoxo em que vivemos - amor e desejo. A luta entre a necessidade que temos de segurança, de laços duradouros, de previsibilidade, de estabilidade, de dependência, de permanência...as âncoras que precisamos, que desejamos, que queremos ter na nossa vida e o risco, a aventura, a audácia, o mistério, a novidade, o desconhecido...a viagem que também ansiamos ter a possibilidade de experimentar.

Como conciliar duas forças tão poderosamente opostas? Duas forças que muitas vezes se repelem. Soa a uma aparente contradição.

Queremos do outro a estabilidade, a segurança, a previsibilidade, o "poder contar com"...no fundo uma identidade, algo a que podemos chamar de "lar"... mas também queremos o desconhecido, o abismo, a loucura. Queremos que o outro seja o nosso melhor amigo, o confidente e simultaneamente o amante apaixonado, o fulano ou fulana da one night stand. Será possível? Será viável?

As pessoas sentem-se mais atraídas pelo parceiro quando ele não está, quando sabe que não o podem ter, quando a imaginação é usada mais frequentemente, quando se anseia pelo reencontro e se espera. Sim, a espera e a antecipação activam o desejo. E o uso da imaginação é a força mais poderosa de todas. É o que nos distingue dos animais. Os animais têm sexo, nós temos uma vida erótica, sexual. Porque usamos a imaginação. Também há mais desejo quando vemos o outro "no seu melhor", ou seja, mais confiante, independente, a brilhar com uma luz própria. Isso acende também, sem dúvida, a chama, põe a trabalhar a engrenagem do erotismo.

Temos de manter então uma distância do outro, para que se olhe para ele de longe e se veja um outro menos familiar, mais misterioso, mais esquivo, que não é um dado adquirido. Então, mesmo nas relações a longo prazo é preciso dar espaço, o espaço individual que é necessário para que o desejo se reacenda uma e outra e outra e outra vez. Há que olhar com novos olhos para a pessoa de sempre. 

No desejo não estamos dependentes do outro, não precisamos dele, não temos de cuidar de ninguém.

O fazer sair cá para fora o nosso pai ou mãe interiores é algo muito importante no amor, mas muito arriscado para o desejo. Desejamos quem nos quer, mas não quem precisa de nós. No amor temos um desejo secreto que o outro precise de nós, mas no desejo aspiramos ter alguém completamente auto-suficiente. É aquela coisa do empoderamento, ou do empowerment, que nos dá a volta à cabeça.

O desejo está associado à novidade. Curiosamente isto pode ser mal interpretado. Podemos achar que essa novidade só é encontrada numa relação extra-conjugal. Não, não precisamos disso para encontrar a novidade, nem a novidade tem a ver com uma série de novas técnicas ou novas posições sexuais. A novidade tem muito mais a ver connosco do que com o outro, com fazer surgir novas partes de nós mesmos, no encontro com o outro, com novas coisas que queremos expressar. Temos de olhar para nós, mais do que olhar para o outro e pensarmos e questionarmo-nos sobre aquilo que nos faz perder o desejo ou, pelo contrário, conectarmo-nos com esse desejo. É estarmos connosco próprios, na presença do outro. É estarmos no nosso corpo, dentro da nossa cabeça e não continuamente no corpo e na cabeça do outro. O desejo é mais egoísta e isso não tem de ser mau.

Para vivermos o desejo tempos de estar seguros. A ansiedade, o medo do julgamento do outro, de não correspondermos às expectativas, o medo de perder o outro, faz-nos ser incapazes de brincarmos, de usarmos a imaginação, de explorarmos.

É importantíssimo percebermos que a paixão funciona por fases, aumenta e diminui, como a lua. E tem de ser trabalhada para ser trazida de volta. O mito da espontaneidade também é perigoso, como se o desejo devesse simplesmente cair-nos em cima quando estamos, por exemplo, a estender a roupa lavada ou a lavar a loiça do jantar. 

E temos de estar seguros de que o desejo e o erotismo são de uma ordem diferente e que isso é mesmo assim, é natural. É no fundo ter a capacidade de ali, naquele espaço, nos afastarmos da responsabilidades e entrarmos num outro universo. Basicamente poderíamos dizer que aquilo que nos excita à noite é aquilo que condenamos durante o dia. A mente erótica não é politicamente correcta, and it's just fine.






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terça-feira, 20 de outubro de 2015

Os psicólogos também chocam de frente


Há uns tempos li um título bastante sugestivo – realmente não há nada melhor do que um bom título – “As fadas  também tomam Prozac”. Na altura não li o artigo, confesso, mas o título não me saía da cabeça e, embora sem me aperceber do erro, fiz uma interpretação minha do título original. Sempre que pensava nele era “As princesas também tomam Prozac”. A ideia de as princesas dos contos de fadas e mesmo de as princesas reais, cujas vidas imaginamos perfeitas e até invejamos, precisarem de medicação, por sofrerem, por não aguentarem as exigências da “profissão”, por não se sentirem capazes de honrar as expectativas que recaiam sobre elas, fazia-me todo o sentido. E houve um dia em que se fez o clique. Era sobre isso que queria escrever: os psicólogos também tomam Prozac – quem diz Prozac, diz Diazepam e Sertralina, mas, convenhamos, não tinha a mesma pinta. Contudo, como não queria levar emprestado um título que não era meu, surgiu-me um substituto, que se enquadrava perfeitamente na ideia que queria transmitir. Podia não ser tão bonito, mas era verdadeiro: Os psicólogos também descarrilam. Uns dias depois, ao falar com uma psicóloga amiga sobre um determinado assunto, dizia-me ela, “não é bem um descarrilamento, é mais um acidente. Um acidente inesperado, como uma crise imprevisível, onde se chocou de frente numa colisão brutal, se partiram as duas pernas, onde há sangue por todo o lado, estamos em choque e a tentar processar o que nos aconteceu, olhando pelo lado de fora para aquele cataclismo, como se não fosse da nossa vida que se tratasse”. E o título simplesmente surgiu. Os psicólogos também chocam de frente. A 180 à hora, contra muros de pedra, paredes de cimento, contra camiões cisterna. Também entram em coma, colapsam, também querem largar tudo da mão, também sentem que não têm forças para continuar, para resistir, para aguentar a pressão.
Escolhi os psicólogos, porque sou psicóloga. Também poderia ter escolhido os professores, porque também sou professora. Ou as mães, porque sou mãe, 4 vezes mãe. Podia até ter escolhido as princesas, embora já só seja uma princesa aos olhos dos meus filhos, ou porque ainda me recordo dos dias em que acreditava ser uma princesa.
O que quero dizer é que há profissões, há papéis sociais que desempenhamos que nos obrigam a ser um exemplo diário, de força, determinação e virtude. Uma mãe não pode chegar um dia e dizer simplesmente “não aguento mais, chega, não quero mais ser mãe!”; uma educadora de infância não pode aparecer um dia sem aquele sorriso rasgado na cara ou a sua paciência infinita; uma política não pode tirar fotografias onde apareçam mais uns centímetros de pele do que os aparentemente estipulados como permitidos, nem pode mostrar a barriga de grávida… Um psicólogo não pode deprimir, não pode não se conseguir ajudar, desistir. É que somos exemplos, vistos como seres perfeitos, sem defeitos, sem pecados. E se até o psicólogo “descarrila”, o que acontecerá com os comuns mortais? Como é que ele pode ajudar outros, se não consegue ajudar-se a si mesmo?
Temos de parecer, mais do que ser. E ninguém quer realmente saber da vida difícil das mães, das princesas, dos psicólogos,dos professores, dos políticos… Tal como os anjos não têm sexo, é como se estas pessoas não tivessem vida. Não lhes é permitida a condição humana.
Nós somos um pouco voyeuristas e encontramos algum tipo de prazer sádico e retorcido na tristeza dos outros ou, para não parecer tão mal, posso simplesmente dizer que a tristeza dos outros, principalmente dos sobrehumanos, torna “os outros” mais humanos… essas crises dos “intocáveis” justificam as fragilidades de quem não tem esse estatuto.
Um médico fuma, embora diga aos seus pacientes para não fumar. Um médico também adoece de uma doença física e morre, não há como escapar, a menos que seja atropelado, assassinado, que caia de um 10º andar… Mas quem não ouviu já dizer “ele está doente? Mas é médico!”.
E os psicólogos também são pessoas, com vida pessoal, com acontecimentos traumáticos, com crises de vida, umas esperadas e outras totalmente inesperadas. Também sofrem, também desesperam e também não encontram em si todas as respostas e todas as estratégias para lidar com os males do mundo e com os seus próprios males. Sofrem pela vida dos outros. Sofrem pela sua própria vida. E por vezes precisam que os ajudem. Os psicólogos também precisam de tempo para se restaurar, para colar os pedacinhos partidos, fazer terapia à alma e reaprender a amar, principalmente a gostarem mais de si próprios. E acreditem, essas experiências, tão humanas, só os tornarão mais entendedores do sofrimento alheio, não mais fracos ou mais incapazes.
Um dia alguém chocou de frente, entrou em coma, deixou de conseguir funcionar, deixou de conseguir trabalhar, de cuidar dos filhos, perdeu o interesse por tudo. Quase desistiu. Aos poucos foi aprendendo novas estratégias, foi descobrindo o que estava a ser ou não tóxico na sua vida, foi encontrando novas formas de lidar com o acidente e criando uma nova identidade, a partir das cicatrizes deixadas, mas não deixando que essas cicatrizes fossem o que o/a definissem. O Prozac pode ter ajudado. Que eu saiba, não é crime tomar medicação, nem vergonha, nem uma maldição. Pode ter sido uma mãe, pode ter sido um professor, pode ter sido um psicólogo… Pode ser qualquer um. Pode ser qualquer pessoa. Porque um dia, todos podemos chocar de frente.





Obrigada Maria Capaz. Obrigada a todos os que partilharam, que deixaram comentários maravilhosos, que fizeram like.



sexta-feira, 10 de julho de 2015

Feira Mini Ideias e um convite muito especial.


Por onde vamos andar amanhã!
Feirinha Mini Ideias organizado por duas médicas - se se sentirem mal por algum motivo, estarão no sítio certo!

Uma feirinha toda voltada para os SALDOS. Isto enlouquece qualquer mãe/mulher, não é verdade?
Roupa clássica, confortável, bonita, prática, desportiva, divertida... há para todos os gostos. 
Um programa para toda a família com sessões de fotografia, comeres e beberes, pinturas faciais, basquetebol, actividades para crianças e workshops para miúdos e graúdos (cupcakes, yoga e conversas com bloggers)


Um convite irrecusável, amável, modesto. Gosto tanto de pessoas assim. Diz que vou ser uma espécie de madrinha :)

Obrigada Inês da página Mini Ideias e Ana do Os rapazes também são fofos

Uma pequena amostra das roupas da Conchinha, que vocês gostam tanto e mais um espaço para falar de famílias e de temas relacionados com a família (16h00-16h30).
Não faltem! Até amanhã heart emoticon




terça-feira, 7 de julho de 2015

És capaz



Ontem decidi que um dia destes escrevo um texto com este título, também como homenagem à Maria Capaz. E como homenagem a muitas mulheres que não sabem, que pensam que não são, que têm medos, ideias catastróficas...mas que no fundo são capazes. One step at a time.

Foi uma honra ver o meu texto lá.
Quem sabe se depois deste não se seguirão outros mais?



http://mariacapaz.pt/cronicas/merde-porque-em-frances-soa-sempre-muito-melhor-por-sofia-arriaga/

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Boa noite. Vamos falar de sexo?



Não, não vamos falar de sexo. Não de sexo no sentido em que nos vem logo à cabeça, apenas e só ligado à genitalidade e ao acto sexual.

Mas podemos falar de sexualidade, de intimidade numa relação a dois, de sexualidade enquanto expressão do amor.

Porque é que no nosso imaginário a sexualidade está tão associada aos órgãos genitais e tão menos à vivência saudável de uma relação?

Porque é que se insiste tanto numa educação para a sexualidade e não de uma educação para as relações?

Vivemos a sexualidade com um pé no paraíso e outro no inferno. Vivemos a sexualidade cheios de ambiguidades - é tão bom, mas é pecado; deseja-se, mas deve reprimir-se; é bom, mas pode ter consequências negativas...
Porque é que a educação sexual nas escolas praticamente começa com um "Têm de ter cuidado" e passa-se imediatamente para as doenças sexualmente transmissíveis, para os perigos de uma gravidez na adolescência, e por aí fora? Prevenir não pode ser meter medo, tornar este assunto num bicho papão, sobre o qual temos de ter pezinhos de lã e mil cuidados.

Vivemos as nossas vidas baseando-nos em mitos. Também no campo da sexualidade construímos a nossa realidade baseada em mitos e preconceitos e crenças enraizadas e muito valorizadas.

“Quando há amor a sexualidade surge de uma forma espontânea e o prazer é a consequência imediata”

“Um casal que se ama tem uma vida sexual intensa”.

“Uma relação saudável é aquela em que não há conflitos”

“Numa relação sexual o orgasmo deve ser simultâneo”.

"Se há amor há desejo"




Se há amor há desejo? Forçosamente?

Há uma crença partilhada de que o desejo é automático em pessoas que se amam. Então se não há desejo isso significa que não há amor? 
Obviamente que isto leva a um enorme stress, no casal.
O que tem menos desejo, sente-se pressionado, sente que tem problemas. O outro sente-se rejeitado, não desejado, o que reforça o mal-estar do outro.
Esta pressão leva a que o que tem menor desejo, tenha relações sexuais só para agradar. Ou acredita que se tiver relações, o desejo vai reaparecer.


Temos, enquanto adultos, de perceber o que é que a sexualidade representa nas nossas vidas, porque são as nossas teorias, as nossas crenças que influenciam o nosso comportamento.

Sabem uma coisa? A forma como nos vemos, como achamos que o nosso parceiro cuida de nós e como ele nos vê, regula o nosso desejo sexual.

A forma como eu me vejo, a forma como eu vejo o outro, como eu penso que o outro me vê, a minha história de vida, os meus modelos internalizados, a forma como eu construí na minha cabeça a ideia do que é um casal, a forma como eu vi os afectos serem geridos na relação entre os meus pais, os meus medos, a minha confiança, a minha autonomia em relação ao outro, a minha capacidade de me entregar e até a capacidade de estar só, vão interferir no desejo. E esta é só uma parte da equação, porque existe o outro e ainda existe um terceiro elemento, que é a própria relação, que vai co-evoluindo, com respeito e compreensão, facilitados pela comunicação.


Amar o outro é não precisar dele. Algo está mal no reino da Dinamarca quando precisamos do outro para gostarmos de nós próprios, para nos validarmos, para nos sentirmos fortes e seguros.












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